Neste artigo, a especialista em embalagens faz um alerta sobre o uso correto da rotulagem e simbologia ambiental
Assunta Napolitano Camilo
A minha experiência em visitar pontos de vendas mundo afora e analisar as embalagens me proporcionou um olhar atento também para a prática do greenwashing. Há muitas oportunidades de melhoria para evitar e avançar nesse ponto que considero tão importante para o aprimoramento da relação embalagem-consumidor–meio ambiente.
A rotulagem e a simbologia ambientais são normas técnicas e, em alguns países, uma lei a ser seguida. Cabe refletirmos sobre a importância em segui-las como postura ética, independentemente da obrigatoriedade.
No Brasil, o Código de Defesa do Consumidor, no Artigo 39, inciso VIII, estabelece que “é vedado ao fornecedor de produtos e serviços colocar no mercado de consumo qualquer produto ou serviço em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes ou, se normas específicas não existirem pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) ou outra entidade credenciada pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Conmetro)”.
As normas técnicas a serem seguidas para a simbologia e declarações idôneas em relação à questão ambiental são:
ABNT NBR ISO 14021:2017 – Rótulos e declarações ambientais – Autodeclarações ambientais (rotulagem do tipo II);
ABNT NBR 16182:2014 – Embalagem e acondicionamento – Simbologia de orientação de descarte seletivo e de identificação de materiais;
ABNT NBR 13230:2008 – Embalagem e acondicionamento de plásticos recicláveis – Identificação e Simbologia.
Rotulagem e simbologia são uma grande oportunidade de estabelecer um “diálogo” com o consumidor para o consumo consciente. Através delas é possível informar qual é o material da embalagem, como reciclá-la e onde descartá-la. Também podem ser utilizadas como ferramentas para conscientizar o consumidor para preservar o meio ambiente, lembrando-o da sua responsabilidade em relação à questão!
Há inúmeras possibilidades de engajar os consumidores e transformá-los de críticos em seguidores! A importância dos símbolos e da rotulagem ambiental está diretamente relacionada com a reciclagem, pois é necessário usar a identificação correta de materiais que oriente o descarte e permita a coleta seletiva.
Além disso, é fundamental que a marca seja transparente e informe corretamente o material utilizado na embalagem e recomende o descarte responsável. Isso é uma clara demonstração de compromisso do fabricante do produto com a sustentabilidade.
A Norma ABNT NBR 16182:2013 estabelece a simbologia para descarte seletivo de embalagens, excetuando-se àquelas que, por força de lei, requeiram uma coleta separada, bem como a simbologia de identificação de materiais de embalagens, favorecendo sua destinação no pós-consumo. Está alinhada ao processo de coleta seletiva no país decorrente da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS, Lei número 12.305 de 2 de agosto de 2010). A simbologia foi adequada para diferenciar o descarte de resíduos sólidos secos e úmidos. Esta norma pretende padronizar a identificação das embalagens para o descarte seletivo, contribuindo para a melhoria contínua das cadeias de reciclagem dos diversos materiais de embalagem.
A norma traz a figura definida para descarte seletivo e a simbologia de identificação dos materiais principais. A aplicação deve ser feita no corpo principal ou rótulo em dimensões que permitam sua visualização. Os símbolos de descarte seletivo e de identificação de materiais devem ser aplicados próximos um do outro, sendo a última prioritária. Embora estes ícones /símbolos comentados aqui se refiram à logística reversa, normalmente estão próximos da rotulagem ambiental.
A norma que devemos seguir para rótulos e declarações ambientais é a ABNT NBR ISO 14021:2017, que tem conteúdo idêntico à ISO 14021:2016 e foi criada diante da proliferação de rotulagem ambiental e necessidade de garantir confiabilidade e harmonização do uso destas declarações. Elas devem ser claras, transparentes, cientificamente sólidas e documentadas para garantir a sua validade.
Por meio de informações precisas, verificáveis, e não enganosas sobre os aspectos ambientais de produtos e serviços, a meta é estimular a demanda e o fornecimento de rotulagem ambiental e o potencial de melhoria ambiental orientada pelo mercado, além de reduzir distorções.
Os conceitos envolvidos na sustentabilidade são altamente complexos e ainda estão em estudo. Portanto, nenhuma declaração para alcançar sustentabilidade deve ser feita baseada em informações vagas. Há 18 requisitos específicos e destacamos aqui os seguintes:
● Devem ser específicas quanto ao aspecto ambiental ou melhoria declarada;
● Não podem sugerir, direta ou indiretamente, uma melhoria ambiental que não exista. Não podem ainda superdimensionar o aspecto ambiental do produto para o qual a declaração foi emitida;
E em relação ao uso de símbolos:
“(5.8.4 ) Um símbolo utilizado para expressar a implementação de um sistema de gestão ambiental não pode ser utilizado de forma tal que seja confundido com um símbolo ambiental que indique os aspectos ambientais do produto.”
Há nove princípios orientativos para a rotulagem/simbologia com base nas normas ISO 14020:
1) Os rótulos devem ser precisos, verificáveis, relevantes e não enganosos;
2) Os procedimentos e requisitos não devem ser preparados, adotados ou aplicados com a intenção de criar obstáculos ao comércio internacional;
3) A rotulagem tem que ser baseada em metodologia científica, suficientemente detalhada, produzindo resultados precisos e reprodutíveis;
4) As informações relativas aos procedimentos, metodologia e critérios utilizados devem estar disponíveis e ser fornecidas para todas as partes interessadas, conforme necessário;
5) O desenvolvimento de rotulagem precisa considerar todos os aspectos relevantes do ciclo de vida do produto;
6) Evitar refrear a inovação que mantém ou tem o potencial de melhorar o desempenho ambiental;
7) Todas as exigências administrativas ou pedidos de informação devem ser limitados ao que é necessário para estabelecer conformidade com os critérios e normas aplicáveis;
8) É conveniente que os processos de desenvolvimento incluam uma consulta ampla e aberta das partes interessadas. Além disso, todos os esforços têm que ser feitos a fim de chegar a um consenso durante tais processos;
9) As informações sobre os aspectos ambientais dos produtos e serviços relevantes devem ser disponibilizadas a todos os compradores e potenciais compradores.
O uso do símbolo de Mobius, que tem a forma de três setas retorcidas que seguem umas às outras, formando um triângulo, sempre deve satisfazer os requisitos gráficos da ISO 7000. Pode ser aplicado à embalagem, acompanhado de um texto explicativo. O símbolo sem um valor de percentual deve ser tratado como uma declaração de que o material é reciclável.
Ao declarar isto, quer dizer que ela pode ser encaminhada ao fluxo de resíduos coletada, processada e retornar para o uso na forma de matéria-prima e:
a) deve ser usada uma declaração qualificada de reciclabilidade;
b) a declaração qualificada tem que expressar adequadamente as limitações de disponibilidade das instalações de coleta;
c) qualificações vagas como “reciclável onde houver instalações”, que não expressem a limitação de disponibilidade de instalações de coleta não são adequadas.
Outro ponto relevante é sobre o uso de material reciclado, pré-consumo ou pós-consumo. Sempre informe a porcentagem na composição da embalagem. Isso pode esclarecer e engajar mais consumidores conscientes e informados.
Ainda conforme a norma, é importante reforçar sobre o termo “sustentável”:
Autodeclarações de sustentabilidade não podem ser feitas. Declarações não qualificadas como “sustentável” e “sustentabilidade” não podem ser usadas.
Desta forma, definidas as normas a serem seguidas, devemos evitar o “greenwashing” ou “maquiagem verde”, ou seja, produtos que apenas parecem ser ambientalmente “corretos”, com inverdades, falácias etc. Tais expressões podem resultar em penalidades e, pior, em rejeição do consumidor, além de colocar em risco a reputação da empresa.
Os consumidores estão cada vez mais conscientes e ações desse tipo podem gerar grande desgaste no relacionamento da marca com eles, causando ainda a publicidade negativa. Evite também frases ou expressões com informações irrelevantes, vazias e sem fonte de informação verificável.
Evite falsos selos que remetem a certificação; ao contrário, qualquer selo deve ter a prova do organismo emissor. Evite ícones por moda ou para fornecer uma compreensão de que o produto é parte de um programa ou cumpre qualquer critério de sustentabilidade quando isso não acontece.
Também evite termos genéricos como “produto verde” ou “amigo da natureza”, ou mesmo “reciclável” sem qualquer base ou comprovação. Infelizmente, a incidência de greenwashing tem aumentado e só fornece desserviço às verdadeiras causas relacionadas à sustentabilidade.
É bom lembrar que “ponto verde” ou símbolo “green dot” é um programa que começou na Alemanha e atualmente está presente em vários países. No entanto, para adotá-lo é preciso pagar uma licença e o seu uso no Brasil não faz sentido. A boa notícia é que muitos consumidores estão contestando essas ações, questionando as indústrias sobre a sua utilização indevida, o que mantém a esperança de que a verdade prevalecerá.
Evitar greenwashing e informar corretamente faz a embalagem melhor para um mundo melhor.
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