A história da utilização de marcas próprias no Brasil começou muito depois de outros países e como alternativa para atender apenas as classes D e E. Para se ter uma ideia, no início, existiam apenas embalagens brancas, com texto em preto, apresentando o produto. Conseguem imaginar?
O panorama no Brasil atualmente é muito melhor, porém, ainda concentrado nas grandes redes de supermercados e para as categorias de alimentos e bebidas. Já há marcas próprias em produtos pessoais, em roupas, mas ainda é pouco expressivo.
O grupo Pão de Açúcar® iniciou o processo no Brasil e está na frente até hoje em termos de posicionamento, número de itens etc. A Taeq® se descolou da marca própria em certa medida, apresentando-se como produto saudável, e tendo até mesmo sublinhas, como light, diet, orgânico. Destaca-se o cuidado da marca com a sustentabilidade nas embalagens. Há muito tempo, a linguagem braille é utilizada na embalagem de papel cartão reciclado; com menor peso, sempre que possível; com identificação ambiental impecável; orientação muito educativa quanto ao descarte; programas integrados para a promoção da reciclagem das embalagens; e incentivo para a devolução de embalagens não utilizadas no momento da compra. Outra ação relevante da rede varejista foi o programa das sacolinhas coloridas para incentivar a coleta seletiva. Ela saiu na frente ao oferecer sacolas retornáveis e a disponibilizar caixas de papelão para os consumidores que assim preferissem.
Essas atitudes e esse posicionamento cuidadosos renderam à marca uma imagem respeitada. O criterioso cuidado com o design da embalagem fortaleceu muito a marca para atingir o sucesso atual e a credenciou para participar também na categoria de produtos pessoais. Fato praticamente isolado no mercado nacional.
O grupo Carrefour® mantém duas marcas próprias: a de baixo preço e a linha Viver®, mais bem posicionada, porém restrita aos produtos alimentícios e bebidas. Porém, na França, é diferente. Há muitos produtos e, ainda, há uma marca premium: a Reflets de France®, que estreou em 1997. Trata-se de uma linha exclusiva de produtos regionais, como a mostarda Dijon ou o patê da Alsácia. Hoje, são mais de 300 produtos de quase 150 produtores que fazem parte de um dos cases mais famosos de sucesso de marcas próprias do mundo.
A Sainsbury® é um varejista inglês, que em meados dos anos 1990, tornou-se a primeira rede de supermercados do Reino Unido a ter mais de 50% do seu volume de negócios em marca própria. Porém, a sua estratégia foi focalizar em produtos com menor preço possível, baseando-se nas ofertas oferecidas pela indústria, ou seja, aproveitando os excessos de capacidade, sem cuidar da marca como fim. O resultado disso é que hoje ela enfrenta problemas.
A rede Tesco®, outra cadeia inglesa, adotou uma estratégia diferente. Ela realizou uma seleção melhor de seus produtos, saindo das commodities. Ela segmentou e criou sublinhas, dando aos seus clientes o que eles queriam: preço bom e diversidade. A grande diferença é que a escolha dos produtos era feita pelo varejista e não pela indústria.
Hoje, a marca Tesco® está presente em muitos países do Leste Europeu e do Ocidente. Ela criou uma linha de produtos orgânicos, uma linha infantil e, talvez, a mais impressionante, a Tesco Finest®. Essa submarca começou nas categorias de refeições prontas e de alimentos refrigerados, nas quais o varejista tem uma vantagem natural (esses produtos são difíceis de preparar e distribuir). O preço excepcional e a qualidade foram bem recebidos pelo consumidor final maior. Também ficou evidente que a Tesco Finest® era uma proposta abrangente e poderia ser expandida para outras categorias. Mas, em vez de tentar dominar o mundo, a Tesco® selecionou áreas específicas, onde poderia agregar valor, por exemplo, as latas de cookies, que se tornam presentes. Aliás, os produtos sazonais são um forte da linha. Outra consideração relevante: a marca apostou em design e já levou muitos prêmios internacionais. Destaque para a sacola de juta, opção oferecida como sacola retornável, que se tornou um hit na Inglaterra.
Na Alemanha, não é diferente. O grande destaque é, sem dúvida, o tamanho do grupo Metro®. Embora a sua estreia no mercado de marca própria seja recente, o supermercado Real® mantém as marcas
: TIP®, real quality® e suas derivações. A TIP® é dedicada aos menores preços e a real quality® é um grande guarda-chuva, ou seja, o cliente pode fazer a compra de mês, comprando apenas produtos da marca. O sortimento é praticamente completo, com produtos de higiene, limpeza, alimentos e bebidas, pratos prontos refinados, snacks, sobremesas, cafés, até pet food para pássaros, gatos e cachorros! A marca comporta ainda uma linha de produtos premium, a real Premium®, com produtos e embalagens mais sofisticadas e a linha de produtos orgânicos.
A drogaria alemã Dm® (Drogarie Markt) também oferece aos seus consumidores a sua marca própria, uma extensa linha, que contempla desde um simples sabonete até produtos anti-idade e de cuidados para pele, além de de produtos pessoais e linha masculina. Além de toda essa diversidade, a drogaria mantém produtos relacionados ao bem-estar, como chás, óleos e cremes para massagens, desodorizadores de ambientes, entre outros produtos.
No país vizinho, na Holanda, a rede de supermercados Albert Heijn® e as lojas de conveniências “AH to go®” mantêm vastíssima linha de produtos de alimentos e bebidas, pet food, produtos de limpeza e, até mesmo em temperos, que é um segmento pequeno, eles estão presentes, e com embalagens bem cuidadas. As redes varejistas holandesas investem em marcas próprias. A rede de lojas HEMA®, muito similar às propostas das nossas “Lojas Americanas®”, usa sua marca para uma ampla lista de produtos, inclusive, maquiagem e produtos pessoais. A Rede Kruidvat® também vende produtos pessoais, como xampu e afins com sua marca.
Redes varejistas da África do Sul, como a Checkers® ou Pik n Pay®, também mantêm duas ou três linhas de produtos, os sem nome ou sem marca. Aliás, “No Name” (que virou marca da rede Pik n Pay® na África do Sul) apresenta produtos commodities ou mais simples de menor preço e uma segunda marca que tem a estratégia da empresa. Normalmente, os custos desses produtos são menores, já que não têm o custo de divulgação ou “marketing”, assim geram uma margem melhor para a empresa e podem contribuir para fidelizar clientes.
Na Argentina, o mesmo acontece nos supermercados. O curioso é a forte presença de marcas próprias em redes de drogarias. O melhor exemplo é a rede Farmacity, que tem uma linha de produtos higiênicos, como lenços de papel, bastonetes, curativos e produtos de higiene pessoal.
Afinal, as marcas próprias são boas ou ruins para o mercado? A resposta sempre depende de como as marcas próprias são conduzidas. Pode ser muito interessante para a indústria atender as redes de supermercados, e com isso reduzir custos, ganhar escala e musculatura para investir num segundo momento em divulgação, embalagens melhores, e assim conquistar seu espaço no mercado. Muitas indústrias trilharam esse caminho. Elas começaram atendendo apenas supermercados e, hoje, têm suas marcas consolidadas. Para o supermercado, trabalhando bem as marcas próprias, ele aumenta sua margem e consolida sua imagem e se fortalece perante seus clientes. Os consumidores ganham na medida em que passam a ter mais opções de escolha, de preços e variedade a seu alcance. Com planejamento, bom senso e pensando em longo prazo, todos podem ganhar muito, e por muito tempo! Sucesso para todos!